Relatos de Racismo no Twitter: As Várias Camadas de uma Dor

Estudo da Orbit captou e filtrou 1.445 tweets relacionados aos termos “eu sofri racismo” ou “eu fui vítima de racismo”, entre abril de 2021 e abril de 2022.

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Relatos de Racismo no Twitter: As Várias Camadas de uma Dor

Vítimas de racismo falam sobre suas dores e como as camadas da discriminação racial as afetam de diferentes formas.

Estudo da Orbit captou e filtrou 1.445 tweets relacionados aos termos “eu sofri racismo” ou “eu fui vítima de racismo”, entre abril de 2021 e abril de 2022.

• Um legado duradouro: O racismo persiste no Brasil mesmo após a Lei Áurea, de 1888. Confirmam-se relatos atuais de experiências de discriminação racial, destacando aspectos como cultura, aparência e subjetividade. 

• Infância, uma iniciação dolorosa: 3% dos tweets totais relacionam experiências de racismo na infância, revelando como muitas pessoas aprendem sobre o racismo de forma traumática desde cedo.  

• Cabelo como alvo principal: O cabelo é frequentemente alvo de atos racistas, assim como a cor da pele. Há um crescimento das opiniões que discutem o tema do colorismo em novembro, mês marcado pelo Dia da Consciência Negra (dia 20 de novembro).

Gráfico 1: Categorias

Infância é o período no qual se aprende o que é o racismo. Infelizmente, da pior forma possível.

Resumindo bem (Zoom-in)

Este estudo revela as múltiplas facetas do racismo e seu impacto profundo na vida das vítimas. As redes sociais, como o Twitter (atual X), tornaram-se espaços legitimados pela comunidade virtual para compartilhar e debater essas experiências, destacando a necessidade contínua de conscientização e combate ao racismo no Brasil. Expor vivências é uma espécie de “terapia coletiva” a fim de demonstrar como as diversas formas deste problema se evidenciam na sociedade.

Panorama geral

Neste estudo, analisamos relatos de racismo no Twitter, expondo as várias camadas dessa dor e as vítimas são afetadas de maneiras diferentes. Foram capturados e filtrados 1.445 tweets relacionados aos termos “eu sofri racismo” ou “eu fui vítima de racismo” entre abril de 2021 e abril de 2022.

O Twitter foi escolhido como fonte da pesquisa por ser a principal rede social que apresenta comentários espontâneos, muitas vezes funcionando como um confessionário ou mesmo uma espécie de diário dos usuários. Conseguimos observar, por exemplo, em que locais acontecem episódios racistas, quais são os alvos e como isso afeta as vítimas.

Principais descobertas:

Foram identificadas 14 categorias a partir dos tweets analisados, abordando diferentes aspectos da discriminação racial. Vamos a elas, por ordem de predominância percentual:

Infância: uma iniciação dolorosa

• O primeiro gráfico do estudo apresenta todas as opiniões separadas em suas respectivas categorias. Entre as 14 categorias, a de maior volume é a ‘Geral’ (32%), que compreende relatos de situações corriqueiras de racismo;

• O destaque dessa categoria vai para a alta ocorrência de discriminação racial sofrida na infância, cerca de 3% de todos os tweets analisados no estudo referem-se à acusação de racismo na infância;

• Exemplo: “Primeiro caso de racismo q sofri, eu tinha 7 anos, fui cortar o cabelo e uns caras mais velhos em volta, convenceram o barbeiro a raspar. ‘Negro tem q raspar’, era isso q eu ouvia c 7 anos.”.

Portanto, muitas crianças aprendem da pior forma possível como se dá o racismo na nossa sociedade.

Evolução das categorias ao longo do período

Abaixo, é possível ver a evolução das categorias ao longo de um ano, período da coleta de menções sobre “eu sofri racismo” ou “eu fui vítima de racismo”.


Sofrer racismo sem entender

• Ainda na categoria ‘Geral’, 1,5% dos usuários afirmaram ter sofrido racismo e não sabiam que se tratava de um ato discriminatório na época;
• As falas de outros 7% dessa categoria deixaram explícito que sofreram racismo mais de uma vez na vida ou várias vezes seguidas;
• O relato de um caso de racismo, portanto, pode ser mais do que apenas um relato. É a exposição de vários casos vividos diversas vezes ao longo da vida.
• Exemplo: “Já fui vítima de racismo várias vezes, mas é foda como cada situação me abala de uma forma diferente.”.

Consequências do racismo

• O racismo dói, machuca e faz chorar. Afeta diretamente a subjetividade das vítimas;
• A categoria ‘consequências do racismo' apresenta principalmente as dores das vítimas de racismo e representa 12,9% do total de opiniões;
• Cerca de 20% dos que relataram consequências do racismo afirmaram ter se sentido “mal” e/ou “chorou” com o episódio sofrido.
• Houve também relatos de impacto na autoestima, busca por terapia, problemas de aceitação e tentativa de suicídio;
• Exemplo: Alguns tweets nesse sentido foram “sofri racismo hj no ônibus e não consegui ter reação nenhuma. não consigo parar de chorar” e “Sofri racismo hoje, fingi ser durão, mas doeu aqui dentro.”;
O racismo também veio associado a outras ofensas como bullying e gordofobia;
• Outros 10% dos relatos dessa categoria disseram ter sofrido racismo amarelo, tipo de discriminação contra povos asiáticos e seus descendentes;
• Percebe-se que os episódios são tão agressivos à subjetividade da pessoa, que afetam até os sonhos, enquanto dormem. Nessa categoria de ‘consequências do racismo’, 3% relatam sonhos em que sofreram descriminação.

O cabelo como alvo principal

• Já a categoria ‘objetos do racismo’ compreende o montante de 8,3% do total de opiniões. Em geral, as pessoas relatam quais foram os alvos atacados por racistas ou ainda em que se sentiram afetadas;
• O cabelo representa o principal alvo dos atos;
• As consequências na aparência também são recorrentes, principalmente em mulheres. Quase 10% da categoria ‘consequências do racismo’ foi de pessoas que tiveram problemas para se aceitar, aceitar o próprio cabelo ou mesmo alisá-lo;
• Nessa categoria, 33% afirmaram ter sofrido por causa do cabelo, enquanto 11% afirmaram que os ataques foram diretamente relacionados à cor de sua pele;
Exemplo: “Sofri a vida inteira por causa do meu cabelo, racismo inclusive dentro de casa, demorei 17 anos para conseguir aceitar e começar a gostar do meu cabelo e pela primeira vez deixei ele crescer e desde então eu nunca mais cortei.”.

O debate sobre o suposto "racismo reverso"

• Racismo reverso existe? A discussão sobre ele, que seria uma espécie de discriminação contra pessoas brancas, reuniu 7,2% das conversas totais;
• A maioria, quase metade (48,2%), ironizou acusações ou desaprovou alegações de racismo reverso, como exemplificado nesse relato: “Nunca sofri racismo! Nenhuma pessoa branca sofreu, sofre ou sofrerá racismo.”.
Outros 27,3% alegaram ter sofrido racismo reverso em algum momento da vida. Para se ter dimensão do volume do debate dessa pauta, a categoria ‘racismo reverso’ foi a 5ª categoria mais recorrente no estudo entre as 14.

Análise de clusters

Grafo de clusters
O grafo de clusters acima mostra como as camadas do racismo relatado no estudo estão integradas. Podemos observar uma aglutinação próxima à rede de ‘sofri racismo na escola’ em que se junta o nó de ‘racismo na infância’ e nós de aspectos relacionados a consequências da discriminação racial, como ‘sofri racismo por causa do cabelo’. Pelo grafo, o nó ‘sofri racismo muitas vezes’ também se liga à rede da escola.

Ações tomadas contra o racismo

• Um dado que chama atenção é o de ações tomadas contra o racismo. Nessa categoria, que compreende 1,3% das opiniões do estudo, há relatos de pessoas que fizeram denúncia contra a discriminação sofrida;
• Destas denúncias, cerca de 76% alegaram que não houve prosseguimento ou punição aos envolvidos;
• Outros 19% afirmaram ter denunciado o ato racista e sofreram consequências, como nesse exemplo de ação tomada no ambiente do trabalho: “na segunda falei pra minha chefe sobre racismo que sofri no lugar e na sexta fui demitida.”.

Racismo na escola

• Cerca de 5% de todas as menções do estudo relataram ter sofrido racismo na escola. A tarefa mais difícil da escola é não sofrer racismo de colegas e professores;
• Segundo as conversas observadas no estudo, a escola é um local onde o racismo é vivenciado com frequência e, muitas vezes, é o primeiro contato com discriminações raciais;
• Atos racistas vêm principalmente de colegas e professores;
• Exemplo: “sofri mt racismo na escola tipo a situação era escrachada ja me chamaram de favelado de merda, ja gritaram volta pra senzala pra mim, ja apanhei.”
Quando o assunto é racismo na faculdade/universidade, os relatos caem para menos de 1% do total.

Racismo no trabalho e em outros ambientes privados

• Outros 5% de todos os tweets do estudo relataram episódios de racismo no trabalho. Chefes e clientes são os agentes mais recorrentes.
• Em relação a estabelecimentos comerciais, os lugares nos quais houveram mais relatos de episódios de racismo são lojas/shopping (57% das citações de estabelecimentos), supermercados (11%) e bancos (7%). A categoria ‘racismo em estabelecimentos comerciais’ representa 4,1% do total observado no estudo.
• Exemplo: “em 2019 eu fui vítima de racismo com um ex-chefe. sempre falo sobre isso porque me marcou muito e de alguma forma fez virar uma chavinha dentro de mim.”.

Racismo online

• A discriminação racial também ocorre nas redes sociais e aplicativos de relacionamento, representando cerca de 2% dos relatos;
• Exemplo: Caso em que a usuária opta por usar uma foto “falsa” de perfil no Twitter: “Amg eu sou preta mesmo. Cabelo crespo. Eu usar essa foto é pra me preservar pq já sofri racismo e exposição aqui nessa rede.”.
• A exposição de episódios racistas nos games (jogos eletrônicos) representa 3,4% do total. Na categoria ‘Racismo nos games’, houve menção a alguns games populares entre jovens, como League of Legend (15% das menções relacionadas a jogos), Valorant (15%) e Counter Strike (4,5%).